O Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiu, por meio de recursos repetitivos, quem deve pagar os impostos devidos por empresa que foi fechada de forma irregular – sem a devida baixa na Junta Comercial. Para a maioria dos ministros da 1ª Seção, o sócio ou o administrador que participou do fechamento (dissolução) deve responder pela dívida, ainda que não estivesse à frente do negócio quando se deixou de recolher os tributos.
Estava em debate na 1ª Seção se o administrador, para ser responsabilizado pela dívida tributária, precisaria ter participado desses dois momentos. Era a parte final da discussão sobre redirecionamento de execução fiscal. Em novembro, os ministros já haviam definido a responsabilidade de quem gerenciava o negócio no encerramento das atividades.
Naquela sessão, os ministros entenderam que aqueles que estavam à frente da empresa no momento em que os tributos deixaram de ser pagos não podem responder se tiverem se retirado do negócio, de forma regular, antes do fechamento.
O julgamento foi retomado ontem com o voto-vista do ministro Herman Benjamin, depois de ser interrompido em fevereiro. Ele seguiu o entendimento da relatora, a ministra Assusete Magalhães. Para ela, sócios e administradores devem responder pelas dívidas independentemente se estavam ou não na empresa no momento em que o tributo deixou de ser pago (REsp 1643944, REsp 1645281, REsp 1645333 e REsp 1867199).
O chamado redirecionamento, disse a ministra em seu voto, é gerado pela dissolução irregular da pessoa jurídica ou a presunção de sua ocorrência, que configura infração à lei, um ilícito civil. Então, o momento do não pagamento do tributo não teria relevância, de acordo com ela.
A ministra afirmou ainda que exigir as duas condições poderia criar uma situação em que, mesmo diante da ocorrência de um ilícito, não haveria sanção. O ministro Og Fernandes, segundo a votar, acompanhou o entendimento da relatora.
A divergência havia sido aberta, em fevereiro, pela ministra Regina Helena Costa. “Há exigência da simultaneidade sim”, disse. Para ela, o redirecionamento da execução fiscal só poderia ser autorizado contra o sócio-gerente que figure concomitantemente no momento do fato jurídico tributário e da dissolução irregular da empresa.
A ministra destacou que a mera inadimplência, apesar de infração tributária, não acarreta a responsabilização dos sócios. É necessário mostrar, acrescentou, que o inadimplemento decorreu da prática de ato ilícito pelos gestores da pessoa jurídica que incorreram em excesso de poderes.
“A caracterização do excesso de poderes reclama, além da prática de ‘atos alheios aos fins da sociedade empresarial’, a produção de consequências fiscais típicas”, afirmou. A ministra citou precedentes do STJ no sentido de que a mera falta de pagamento de tributo não leva à responsabilidade subsidiária dos sócios.
No entendimento da ministra, a dissolução irregular não é fato suficiente para redirecionar a cobrança ao sócio, a menos que se reconheça um nexo causal entre o ilícito que gera o inadimplemento de obrigação tributária e a dissolução irregular.
Os ministros Gurgel de Faria e Benedito Gonçalves, que votaram ontem, ficaram vencidos com a ministra Regina Helena Costa. Seguiram a relatora, além de Og Fernandes e o ministro Herman Benjamin, Francisco Falcão, Manoel Erhardt e Mauro Campbell Marques.
Herman Benjamin, em seu voto-vista, entendeu que se a mesma pessoa participou dos dois momentos não se tem dúvida de que deve ser responsabilizada pelo pagamento dos tributos. Para ele, porém, não caberia o redirecionamento se o sócio ou administrador estava à frente da empresa apenas durante a ocorrência do fato gerador.
“Tal fato, por si só, não constitui ato de infração à lei ou ao contrato social, como é, entretanto, a promoção da dissolução irregular”, disse o ministro, acrescentando que o administrador que ingressa após a ocorrência do fato gerador pode ser responsabilizado pelo fato de o fechamento da empresa sem as devidas providências legais ser considerado um ato ilícito.
A decisão está de acordo com o entendimento da União sobre o tema, segundo o procurador Sandro Soares, coordenador da atuação da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) no STJ. A procuradora Marise Correia foi a responsável pelo acompanhamento do caso.
Para o procurador, a decisão é importante porque já não é possível recuperar valores da sociedade que desapareceu por dissolução irregular e, se a decisão fosse em sentido contrário, também não seria possível recuperar dos sócios anteriores se eles se retiraram regularmente da sociedade sem infração à lei ou ao contrato social.
O procurador destaca que, pelo entendimento do STJ, a impontualidade no pagamento de tributo, por si só, não é causa de responsabilidade. Mas como o sócio foi a última pessoa à frente da sociedade, acrescenta, ele pode ter contribuído para o encerramento irregular por ação ou ato omissivo.
Fonte: Valor Econômico – Por Arthur Rosa e Beatriz Olivon — De São Paulo e Brasília 26/05/2022